Repertório 451 MHz,

Armadilha para Antonio Candido

No novo episódio do 451 MHz, o professor e crítico literário Sérgio Alcides fala sobre a atualidade da obra do sociólogo e a vida acadêmica hoje em dia

11maio2023

Está no ar o 87º episódio do 451 MHz, o podcast da revista dos livros. Um dos principais acontecimentos culturais do ano é o relançamento da obra de Antonio Candido, um dos maiores pensadores do Brasil. Neste episódio, o professor e crítico literário Sérgio Alcides fala sobre a atualidade da obra do sociólogo e a vida acadêmica hoje em dia.

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O criador do cânone


O professor e sociólogo Antonio Candido [MarcosSantos/USPImagens/Reproducao]

A obra de Antonio Candido está sendo relançada pela editora Todavia, e cinco dos títulos já chegaram às livrarias. Formação da literatura brasileira: momentos decisivos, de 1959, centralizou o debate no Brasil e influenciou críticos estrangeiros como o uruguaio Ángel Rama e a argentina Beatriz Sarlo. Os parceiros do Rio Bonito, lançado em 1964, é a tese de doutorado de Candido, na qual utiliza o funcionalismo de Malinowski para reconstituir as formas de sociabilidade do mundo rural e recorre ao materialismo histórico para explicar a desagregação da cultura caipira. Literatura e sociedade, de 1965, foi o livro de sociologia da arte mais influente na América Latina nos anos 60, segundo o antropólogo argentino Néstor García Canclini. Iniciação à literatura brasileira, de 1997, é um resumo da produção literária do país que tem como público-alvo leitores estrangeiros. Os ensaios de O discurso e a cidade refletem sobre a interação do concreto com a literatura e como essa não constitui um acesso direto ao real ou ao histórico.

A importância do lançamento rendeu ao pensador a capa da edição de abril da Quatro Cinco Um, em ilustração feita por Rodrigo de Andrade.

Na edição, o convidado do 451 MHz, o crítico literário e professor da Universidade Federal de Minas Gerais Sérgio Alcides escreveu sobre dois livros de Candido: Iniciação à literatura brasileira e o clássico Formação da literatura brasileira: momentos decisivos. “Não por acaso foi justamente Candido quem pensou essa história literária não como mera sucessão de obras superficialmente comentadas, em ordem cronológica, e sim como faria um historiador de verdade — a partir de uma articulação bem mais complexa, um sistema, ligando, no caso, autores, obras e leitores. E você, acostumado a ser tratado pelo sacrossanto mercado como o ‘Lobo bobo’ trata um ‘chapeuzinho de maiô’, descobre que na Formação sua capacidade de leitura faz parte do objeto estudado”, observou.


O crítico literário e professor Sérgio Alcides [Pedro Freitas/Acervo pessoal]

Esse especial traz ainda resenhas de Bianca Tavolari sobre O discurso e a cidade e de Mário Augusto Medeiros da Silva sobre Literatura e sociedade. Mariana Luz Pessoa de Barros escreveu sobre como o memorial de Antonio Candido revela pistas sobre a vida do professor pré-currículo Lattes. Yasmin Santos, sobre as visões de Antonio Candido, Álvaro Lins e Afrânio Coutinho e a lacuna de estudos sobre obras fora do cânone.

Alcides também é o autor de um dos textos mais emocionantes publicados na Quatro Cinco Um: um texto de despedida para Antonio Candido, morto em maio de 2017. “A morte de Antonio Candido, no dia 12 de maio passado, despertou uma sensação de perda coletiva que há muito tempo não se manifestava no país. Uma enxurrada de postagens e telefonemas se produziu em poucas horas, como se de algum modo fosse inesperado o falecimento de uma pessoa de 98 anos. A nação inteira ficou órfã — dizia o lugar-comum, sem que se possa conciliar direito essa certeza com o fato perturbador de que apenas uma parte reduzida dela sabe de quem se trata. O sentido público do acontecimento trouxe uma perplexidade a mais para um contexto nacional já bastante desnorteado. Muita gente lamentou: ‘Logo agora?’”, escreve.

Na conversa do 451 MHz, o apresentador Paulo Werneck comenta o ensaio “Armadilha para Ana Cristina”, que Alcides escreveu para a poeta Ana Cristina Cesar. O texto foi publicado em livro em 2000, pela editora Verso.

Além de professor e crítico literário, Alcides também é poeta, tendo publicado três livros de poemas: Píer (Editora 34, 2012), Nada a ver com a lua (7Letras, 1996) e O ar das cidades (Nankin, 2000).

Publicou também os livros de não ficção Estes penhascos. Cláudio Manuel da Costa e a paisagem das Minas (Hucitec, 2003) e organizou e prefaciou edições de Eu e outras poesias, de Augusto dos Anjos (Ática, 2005), e Luz mediterrânea, de Raul de Leoni (2001), entre outros títulos.

A crítica da crítica

Sobre a crítica literária, Alcides deixou claro que não é preciso concordar com uma obra inteira para reconhecer um grande trabalho. Ele traz como exemplo os escritos de Roberto Schwarz e o livro Humildade, paixão e morte: a poesia de Manuel Bandeira, de Davi Arrigucci. Jr (Companhia das Letras, 1990).

Outra crítica literária comentada ao longo do episódio é Flora Süssekind, autora do visceral ensaio “A crítica como papel de bala”, réplica aos volumes de História da inteligência brasileira, de Wilson Martins, que trazia um inventário do que era lançado ano a ano no Brasil. Alcides elogiou o último livro da escritora, Coros, contrários, massa (Cepe, 2022).

Martins ainda foi imortalizado na obra de Candido no livro O albatroz e o chinês.

O melhor da literatura LGBTQIA+

O jornalista Gustavo Fioratti indica o livro Retrato de um viciado quando jovem, de Bill Clegg, traduzido pela Julia Romeu e publicado no Brasil em 2011 pela Companhia das Letras.

O livro é narrado pelo próprio autor, um dependente químico do crack, no qual conta situações extremas vividas por causa dessa dependência. Traz relatos da infância, de compulsão sexual e de sua relação com outros dependentes químicos, motoristas de táxi, traficantes, garotos de programa e com seu marido, que ficou ao seu lado durante todo esse processo.

Confira a lista completa de indicações dadas no podcast 451 MHz, no bloco O Melhor da Literatura LGBTQIA+.

O 451 MHz é uma produção da Rádio Novelo e da Associação Quatro Cinco Um.Apresentação: Paulo Werneck
Coordenação Geral: Évelin Argenta e Paula Scarpin
Produção: Ashiley Calvo
Edição: Gabriela Varella
Produção musical: Guilherme Granado e Mario Cappi
Finalização e mixagem: João Jabace e Luis Rodrigues, da Pipoca Sound
Identidade visual: Quatro Cinco Um
Coordenação digital: Juliana Jaeger e FêCris Vasconcellos
Para falar com a equipe: [email protected]