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Ana Maria Gonçalves e Cidinha da Silva conversam sobre a importância histórica de ‘Um defeito de cor’ e de Maria Firmina dos Reis, autora homenageada da Flip

11nov2022

Está no ar o 75º episódio do 451 MHz, o podcast da revista dos livros. No mês da Consciência Negra, duas das principais autoras contemporâneas do país, Ana Maria Gonçalves e Cidinha da Silva, contam como ficaram amigas, conversam sobre a importância histórica de Um defeito de cor e de Maria Firmina dos Reis, autora homenageada da Flip.

Duas vezes por mês, trazemos entrevistas, debates e informações sobre os livros mais legais publicados no Brasil. O 451 MHz tem apoio dos Ouvintes Entusiastas. Seja um você também! Este episódio tem ainda apoio da Companhia das Letras.

Ana Maria Gonçalves escreveu um dos livros brasileiros mais importantes deste século, Um defeito de cor, que comemora neste ano dezesseis anos de publicação. A editora Record lançou agora uma edição especial, com texto de orelha de Cidinha da Silva e imagens de obras da artista Rosana Paulino. O livro também foi recentemente recomendado por Luiz Inácio Lula da Silva em suas redes sociais, ao lado de Torto aradoem 2020, ele já havia tuitado sobre o romance.

Cidinha da Silva é uma das principais cronistas do país, e bastante produtiva. Aos 55 anos, já publicou dezenove livros. Os mais recentes são as reedições Menina linda e outras crônicas, pela Oficina Raquel, e Exuzilhar, pela editora Pallas.

        

Sua obra mais conhecida é Exu em Nova York, lançada em 2018 pela editora Pallas e que ganhou o prêmio da Fundação Biblioteca Nacional na categoria conto. 

Cidinha da Silva é convidada deste ano da Flip, a Festa Literária de Paraty, que homenageia a escritora negra Maria Firmina dos Reis, e escreveu um texto sobre a autora maranhense e a solidão das mulheres negras em espaços de poder na edição de novembro da Quatro Cinco Um. Ela participa de uma mesa com Cristhiano Aguiar, que participou do episódio anterior do 451 MHz.

De Exu a Luiz Gama

Para Cidinha da Silva, Um defeito de cor é um dos três principais livros publicados no Brasil, a partir dos anos 70, junto com Viva o povo brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro, e Cidade de Deus, de Paulo Lins. Ela também comenta a importância da obra musical de Gilberto Gil, Milton Nascimento e Paulinho da Viola na sua formação.

        

Antes de publicar Um defeito de cor, que teve Millôr Fernandes como um de seus primeiros leitores, Ana Maria Gonçalves já havia escrito Ao lado e à margem do que sentes por mim, lançado em 2002 e que teve circulação restrita, em edição artesanal.

Depois do sucesso de Um defeito de cor, lançado em 2006, Gonçalves ficou sete anos sem conseguir escrever diante das expectativas em torno do seu próximo romance. Atualmente, ela tem um manuscrito pronto, intitulado Quem é Josenildo?, que está na gaveta à espera da reescrita da autora. Gonçalves revelou que sente grande prazer em reescrever seus textos — Um defeito de cor teve dezenove versões diferentes. Já Cidinha da Silva hoje está com um projeto de romance.

No episódio, ambas falaram da importância de Exu para a vida e o processo criativo de cada uma — é o orixá da comunicação e que abre os caminhos. Outra figura que dominou a conversa foi Luiz Gama, filho de Luísa Mahin, protagonista de Um defeito de cor, no qual se chama Kehinde, seu jeje.

Para Cidinha da Silva, pessoas do vulto de Luiz Gama teriam sido matéria-prima para vários filmes, livros e séries. O jurista foi capa de uma edição especial da Quatro Cinco Um, com ilustração de Marcelo D’Salete, que trouxe três textos sobre a importância desse homem negro, ex-escravizado, que lutava na justiça pela libertação de escravos na segunda metade do século 19.

As obras completas de Luiz Gama foram publicadas ano passado pela editora Hedra e foram resenhadas na revista pelo historiador Thiago André. O abolicionista também foi tema do episódio do 451 MHz “Luiz Gama no campo de batalha”, que contou com a presença do professor e jurista Silvio Almeida e da professora de literatura Ligia Fonseca Ferreira, organizadora de Lições de resistência: artigos de Luiz Gama na imprensa de São Paulo e Rio de Janeiro, que traz cerca de sessenta textos do autor, dos quais 42 eram inéditos em livro e ainda desconhecidos. O episódio contou ainda com a participação do ator Antonio Pitanga lendo a famosa carta autobiográfica de Gama. 

A sua história de vida, finalmente, foi transposta para o cinema neste ano pelo cineasta Jeferson De, com o filme Doutor Gama, disponível no GloboPlay. Veja o trailer abaixo:

O Museu de Arte do Rio (MAR) está com uma exposição sobre Um defeito de cor, que fica em cartaz até 23 de maio de 2023, e faz uma revisão historiográfica da escravidão abordando lutas, contextos sociais e culturais do século 19 a partir do recorte do livro. A curadoria, que traz quatrocentas obras de arte de mais de cem artistas de localidades como Rio de Janeiro, Bahia, Maranhão e até mesmo do continente africano (dentre os quais, apenas quatro brancos), foi feita por Amanda Bonan, Marcelo Campos e Ana Maria Gonçalves.

 

Mais na Quatro Cinco Um

Cidinha da Silva já havia sido entrevistada por Paula Carvalho para a seção Fichamento, na edição 42 da Quatro Cinco Um, sobre a reedição de Oh, margem! Reinventa os rios!, lançada pela editora Oficina Raquel.

A edição de novembro da revista dos livros traz dois textos sobre a homenageada da Flip. Além do escrito pela Cidinha da Silva já citado acima, há outro assinado pela jornalista Yasmin Santos, que se debruçou sobre a vida da precursora da literatura negra feminina e primeira romancista do Brasil. “A imagem de Maria Firmina dos Reis é um quebra-cabeça. Não temos notícia de que a primeira romancista brasileira tenha nos deixado retrato, desenho ou pintura de seu rosto. O esforço de escrita e publicação parece ir de encontro a um (imposto) anonimato de mulheres escritoras do século 19. Da autora maranhense temos apenas o nome, a obra e relances de sua trajetória. O suficiente para lhe render homenagens no bicentenário de seu nascimento, como o faz esta edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip)”, escreveu ela.

Várias edições do romance Úrsula, de Maria Firmina dos Reis, já haviam sido resenhadas pela escritora Jarid Arraes na edição 19 da Quatro Cinco Um. “Úrsula, publicado originalmente sob o pseudônimo ‘Uma Maranhense’, conta a história de um casal branco que se apaixona tragicamente. Impedidos de viver o amor pelas intrigas familiares, o par de ingênuos é cercado por dor e morte. Seu ineditismo estava na contundente crítica à escravidão. A misoginia e o racismo são expostos com crueza e juízo, bem como o patriarcado e o escravagismo — nenhum deles desfila intacto”, refletiu a autora.

O melhor da literatura LGBTI+

Natália Borges Polesso, autora de A extinção das abelhas e Amora, publicados pela Companhia das Letras, indica Fome azul, de Viola Di Grado, publicado pela editora Dublinense em 2022, traduzido do italiano por Eduardo Krause.

O romance traz uma história simples: uma moça italiana, com o intuito de tentar superar a morte do irmão gêmeo, resolve viajar até Xangai, onde se apaixona pela misteriosa chinesa Xu. A história segue, então, por uma cidade meio gótica, do submundo, aventurando-se por gostos e sabores que nunca havia experimentado antes.

Confira a lista completa de indicações dadas no podcast 451 MHz, no bloco O Melhor da Literatura LGBTQIA+.

O 451 MHz é uma produção da Rádio Novelo e da Associação Quatro cinco um.
Apresentação: Paulo Werneck e Paula Carvalho
Coordenação Geral: Évelin Argenta e Paula Scarpin
Produção: Ashiley Calvo
Edição: Cláudia Holanda
Produção musical: Guilherme Granado e Mario Cappi
Finalização e mixagem: João Jabace
Identidade visual: Quatro Cinco Um
Coordenação digital: Juliana Jaeger e FêCris Vasconcellos
Para falar com a equipe: [email protected]