Ofélia, Lady Macbeth e outras mulheres de Shakespeare

Está no ar o 103º episódio do 451 MHz, o podcast da revista dos livros. Nele, a escritora Nara Vidal fala sobre como as personagens femininas permitem uma nova leitura da obra de William Shakespeare. Ela também comenta a complexidade e as nuances narrativas dessas personagens, que fogem aos padrões conferidos às mulheres da época. Este episódio tem o apoio da Lei de Incentivo à Cultura. 

A autora comenta a influência contínua e incessante das obras do dramaturgo William Shakespeare nos estudos literários a partir de novos espectros de observação. Para ela, a temática feminina pode sempre ser apreendida e explorada nos livros.

Nara Vidal [acervo pessoal]

Com anos de pesquisa em torno da literatura de língua inglesa, Nara Vidal reside na Inglaterra, onde leciona e produz ensaios sobre a temática já há algum tempo. Em 2023, ela lançou, pela editora Relicário, o livro Shakespearianas: As mulheres em Shakespeare, primeira obra de Nara de não ficção. A coletânea reúne ensaios que analisam e resgatam quinze personagens femininas da obra do dramaturgo — de figuras icônicas a coadjuvantes.  

Shakespearianas: As mulheres em Shakespeare, de Nara Vidal

Segundo a autora, o texto que escreveu em 2021 para a Quatro Cinco Um sobre a desobediência feminina em Shakespeare foi essencial para a organização do livro, publicado em 2023. 

Espectro feminista 

Nara acredita que não se deve definir e catalogar obras clássicas a partir de teorias atuais, tampouco conferir a Shakespeare o recorte de um autor feminista. Para ela, o caminho ideal é transpor as peças à luz dessas teorias, buscando compreender o que elas podem representar hoje. 

Assim, Shakespearianas destaca aspectos impostos à experiência das mulheres que conferem às peças outras camadas de complexidade quando são devidamente observadas. Entre elas, a castidade feminina como moeda de troca em diversas obras; a menção a um aborto que Ofélia teria sofrido em Hamlet; e a violência brutal cometida em um estupro seguido por mutilações contra Lavínia, personagem de Tito Andrônico.

   
Hamlet e Tito Andrônico, de William Shakespeare

Consciência estratégica feminina

Para além dessa espiral de abusos e sofrimentos causados às personagens, Nara destaca o  aspecto impulsionador e instigante das mulheres em Shakespeare, que fogem aos padrões correntes na sociedade da época. A escritora retoma a análise de Virginia Woolf em Um teto todo seu, que pontua a gama de possibilidades das personagens. 

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Por não ocupar a posição de agentes — concedida exclusivamente aos homens — as mulheres exercem o papel de observadoras e manipuladoras estratégicas nas tramas, como nos casos de Lady Macbeth e Tamora. A autora também enfoca Cleópatra, que seria a única a desfrutar de uma posição de poder, autonomia financeira e independência em relação aos homens.

    
Macbeth e Antônio e Cléopatra, de William Shakespeare

A representação travestida em palco

Um dos aspectos também considerado pela autora na análise dessas obras se refere à representação que elas recebiam. Isso porque, na época em que foram escritas, as peças não eram encenadas por mulheres, e sim por atores travestidos, o que adicionava ao enredo mais uma demão de embaralhamento. É o caso de Viola, personagem de Noite de reis, que no texto se fantasia de homem, mas no palco era representada por um ator interpretando uma mulher fantasiada de homem. 

Ao longo do tempo, Shakespeare abusaria de chamarizes como esse para suas peças, considerando um público cada vez mais exigente e as diversas possibilidades de entretenimento que surgiam à época.

   
Eva e Mapas para desaparecer, de Nara Vidal

Nara Vidal foi finalista do prêmio São Paulo de Literatura com o romance Eva, publicado pela editora Todavia, em 2022, e finalista do prêmio Jabuti, em 2021, por Mapas para desaparecer, da editora Faria e Silva. Os livros exploram temas como repressão sexual, dinâmicas das relações cotidianas, preconceito e os desafios da presença da mulher na sociedade. 

Mais na Quatro Cinco Um 

Além do texto sobre a desobediência feminina nas personagens de Shakespeare, Nara Vidal escreveu sobre as mulheres loucas na obra de Brontë e Ferrante e a genialidade de Emily Dickinson para a Quatro Cinco Um.

A atriz e escritora Fernanda Torres compôs para a Quatro Cinco Um a resenha de Reflexões sobre Shakespeare, de Peter Brook. Já Eliana Cardoso escreve a respeito das mulheres crossdressers de Shakespeare. No 85º episódio do 451 MHz, Rodrigo Lacerda e Sofia Nestrovski conversaram sobre as traduções e a obra de Shakespeare. 

O melhor da literatura LGBTQIA+

O escritor e roteirista Juan Jullian indica As vantagens de ser você, de Ray Tavares, publicado, em 2022, pelo selo Galera, do Grupo Editorial Record.

As vantagens de ser você, de Ray Tavares

Confira a lista completa de indicações do podcast 451 MHz, no bloco O Melhor da Literatura LGBTQIA+.

O 451 MHz é uma produção da Rádio Novelo e da Associação Quatro Cinco Um.
Apresentação: Paulo Werneck e Paula Carvalho
Coordenação geral: Évelin Argenta e Paula Scarpin
Produção: Ashiley Calvo
Edição: Luiza Silvestrini
Produção musical: Guilherme Granado e Mario Cappi
Finalização e mixagem: João Jabace e Luis Rodrigues, da Pipoca Sound
Identidade visual: Quatro Cinco Um
Coordenação digital: Bia Ribeiro
Para falar com a equipe: [email protected]