Repertório 451 MHz,

Na encruzilhada com Stella do Patrocínio

Uma conversa sobre a internação da poeta, o seu falatório, ‘Reino dos bichos e dos animais é o meu nome’ e por que Stella vai além da poesia

12nov2021

Está no ar o 52º episódio do 451 MHz, o podcast da revista dos livros! Duas vezes por mês, trazemos entrevistas, debates e informações sobre os livros mais legais publicados no Brasil. Neste episódio, Paula Carvalho, editora da Quatro Cinco Um, recebe as pesquisadoras Anna Carolina Vicentini Zacharias, Bruna Beber e Sara Ramos (Unila) para falar sobre Stella do Patrocínio. No episódio foram discutidos temas como racismo, luta antimanicomial, poesia, oralidade e necropolítica no falatório de Stella do Patrocínio.

Anna Carolina Vicentini Zacharias é doutoranda na área Teoria e História Literária na Unicamp e ela fez mestrado sobre a trajetória de Stella do Patrocínio (a dissertação pode ser baixada aqui). 

Bruna Beber defendeu neste ano uma dissertação em que coloca Stella do Patrocínio não na chave da poesia, mas na da profecia (o mestrado dela pode ser baixado aqui). Esse trabalho vai ser publicado em livro no ano que vem pela editora José Olympio, do Grupo Editorial Record. Além disso, ela  é poeta. Seu livro Ladainha (Record, 2017) foi resenhado por Angélica Freitas na segunda edição da Quatro Cinco Um

Sara Ramos é mestranda em literatura comparada pela UNILA e coloca Stella do Patrocínio dentro da tradição afrodiaspórica brasileira (sua dissertação, defendida recentemente, ainda não está disponível on-line, e ela pretende disponibilizar gratuitamente, em breve, os registros do falatório de Stella na internet como parte do seu trabalho acadêmico na biblioteca digital da Unila)

Stella do Patrocínio ficou conhecida depois da sua morte, em 1992, após mais de trinta anos internada na Colônia Juliano Moreira, no Rio de Janeiro, com a publicação do livro Reino dos bichos e dos animais é o meu nome (Azougue, 2001), organizado pela poeta e filósofa Viviane Mosé, a partir dos falatórios de Stella gravados pela artista plástica Carla Guagliardi, no fim dos anos 80, e de transcrições de outras conversas de Stella feitas pela psicóloga Mônica Ribeiro de Souza.

O 451 MHz tem apoio dos Ouvintes Entusiastas. Seja um você também! O podcast tem ainda apoio do do banco digital brasileiro C6 Bank, do Grupo Editorial Record e do podcast Rádio Companhia, da Companhia das Letras

A voz das Ruas

Poeta? Ou profeta? Qual lugar ocupa o falatório de Stella do Patrocínio? É uma pergunta sem respostas concretas, mas uma coisa é certa: é importante escutar Stella. Para além das narrativas institucionais e vinculadas a estereótipos racistas, precisamos estar abertos a entender o que ela tinha a dizer sobre si mesma.


Stella do Patrocínio em liberdade antes da internação forçada [Acervo pessoal de seu sobrinho, cedido à pesquisadora Anna Carolina Vicentini Zacharias]

Sendo “louca” ou “enlouquecida”, Stella, tal como muitos outros internos em hospitais psiquiátricos, não deixou de ter voz. Os seus falatórios poéticos ocupam um lugar na encruzilhada de tempos, corpos e espaços que não podem ser facilmente rotulados como uma coisa ou outra. As ruas, um tópico recorrente em seu falatório, simbolizam tanto o lugar em que ela foi sequestrada quanto o local de reencontros. 

Para Sara Ramos, a psiquiatria serviu como instrumento para a necropolítica, contribuindo com o sequestro, físico e subjetivo, de pessoas negras, tema que ela desenvolve na sua dissertação de mestrado. O trabalho de Anna Carolina Zacharias desconstrói uma série de estereótipos que existia sobre a figura de Stella, por exemplo, a de que ela era analfabeta e teria sido abandonada no hospício pela família. Já Bruna Beber insere os falatórios de Stella do Patrocínio em uma tradição bem mais abrangente de cosmogonias que vão da mitologia grega às tradições desana (indígenas), passando pelo candomblé.  

Uma performance de Patrocínio

Natasha Felix é educadora, escritora, redatora, poeta e performer, e em 2020 publicou em seu canal no YouTube uma dramatização das construções poéticas de Stella do Patrocínio intitulada Muito Bem Patrocinada – Falatórios de Stella do Patrocínio. Confira abaixo:

Mais na Quatro Cinco Um

Stella do Patrocínio écapa da edição 51 da Quatro Cinco Um. Na edição, Guilherme Gontijo Flores reflete sobre como, sem ter escrito um só poema, o falatório de Stella pertence ao patrimônio poético brasileiro. Diane Lima discute como a história de Stella do Patrocínio pode ser situada como um importante contraponto à história da arte moderna. Rachel Gouveia escreve um artigo sobre as relações entre a luta antimanicomial brasileira e os registros do falatório da poeta.

A insubmissão e loucura feminina também já foram temas tratados no 451 MHz, no episódio 49 – Vozes do hospício, em que recebemos a jornalista Patricia Campos Mello e a historiadora Silvana Jeha para falar sobre a vida de Aurora Cursino e de Nellie Bly. A relação entre antirracismo e a prática clínica na obra de Frantz Fanon foi resenhada por Deivison Faustino na edição 33 da revista dos livros.

Narradores do Brasil

Na coleção de episódios roteirizados Narradores do Brasil, o 451 MHz faz breves incursões no formato narrativo para explorar a vida e a obra de nossos grandes autores. Ouça os episódios sobre Rubem Fonseca, Lygia Fagundes Telles, Nelson Rodrigues,  Paulo Freire e Caio Fernando Abreu.

O melhor da literatura LGBTI+

No quadro, que tem apoio do C6 Bank, a tradutora e colaboradora do 451 MHz Marcela Vieira recomenda o livro A vida de Vernon Subutex (Companhia das Letras, 2019), da escritora Virginie Despentes. A vida de um homem hétero de meia-idade, ex-dono de uma loja de vinis que se encontra completamente sozinho e em crise financeira. Por conta disso, acompanhamos a sua busca por uma moradia através de estadias na casa de amigos e conhecidos, usando muitas vezes mentiras e desculpas. Em uma dessas casas, ele conhece a transsexual brasileira Márcia e se apaixona por ela.

O 451 MHz é uma produção da Rádio Novelo e da Associação 451.
Apresentação: Paulo Werneck e Paula Carvalho
Coordenação Geral: Paula Scarpin e Vitor Hugo Brandalise
Produção: Gabriela Varella
Edição: Claudia Holanda
Produção musical: Guilherme Granado e Mario Cappi
Finalização e mixagem: João Jabace
Identidade visual: Quatro Cinco Um
Coordenação digital: Juliana Jaeger
Gravado com apoio técnico da Confraria de Sons & Charutos (SP).
Para falar com a equipe: [email protected]