Listão da Semana,

A primeira expedição brasileira e mais 7 lançamentos

Nesta semana, chegam às livrarias brasileiras ‘Catorze camelos para o Ceará’, uma HQ sobre o sistema de castas indiano e o novo romance da irlandesa Sally Rooney

09set2021

Um engenheiro, um botânico e um poeta entram num bar — ou algo assim. Em 1859, o barão de Capanema, Francisco Freire Alemão e Gonçalves Dias saíam do Ceará para iniciar a primeira expedição científica brasileira. Com eles estavam catorze camelos importados da Argélia, vindos em uma viagem de navio que durou cerca de um mês. Quem conta o périplo — que combina pioneirismo, conflitos e certa dose de cachaça — é o jornalista Delmo Moreira, no livro Catorze camelos para o Ceará, que chega nesta semana às livrarias. Em tempo: viva a ciência nacional!

Completam e seleção da semana uma HQ sobre o sistema de castas indiano, uma reflexão sobre a repressão à comunidade LGBT durante a ditadura militar, o novo romance da irlandesa Sally Rooney, o livro que marcou a estreia da argentina Sara Gallardo, uma antologia de poemas da paraense Olga Savary e ensaios sobre a dominação patriarcal e o feminismo caricato.

Viva o livro brasileiro!

Catorze camelos para o Ceará: a história da primeira expedição científica brasileira. Delmo Moreira.
Todavia • 288 pp • R$ 74,90/39,90

O livro narra a história da primeira expedição científica organizada pelo Império, e integrada unicamente por brasileiros, para desbravar as regiões menos conhecidas do país e, quem sabe, encontrar minérios e outras riquezas. Ela reunia o barão de Capanema, o botânico Francisco Freire Alemão e o poeta Gonçalves Dias, que na época era professor de latim e de história no Colégio Pedro 2º. Proposta pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro em 1856, a viagem teve os recursos liberados pelas leis orçamentárias de 1857 e 1858 e começou em 1859. Levava catorze camelos importados para transportar os pesquisadores e a carga pelas regiões semiáridas do Ceará, mas a ideia não deu certo. O jornalista descreve os equívocos, os ridículos, as brigas e a inutilidade da expedição. 

Leia também: Aquarelas do século 19 registraram a ictiofauna brasileira coletada na expedição do anti-darwinista Agassiz.

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O alcazar. Simon Lamouret.
Trad. Renata Silveira • Nemo/Autêntica • 208 pp • R$ 79,80/55,90

Nascido em 1987, o artista francês estudou ilustração em Angoulême e Strasbourg e, de 2013 a 2018, foi professor em uma escola de design em Bangalore, na Índia. De sua experiência nasceram duas obras: Bangalore (2017) e O alcazar, publicado no ano passado. O romance gráfico traz um painel da Índia contemporânea e de suas religiões, línguas e castas sociais, tendo como foco o canteiro de um edifício em construção, no qual se concentra uma dúzia de personagens típicos do país: um empreiteiro rico, um gerente inexperiente, um chefe linha-dura, operários provincianos, azulejistas rajastanis e hindus conservadores. 

Leia também: Livro mostra pontos de contato entre a escravidão norte-americana, o nazismo alemão e o sistema de castas na Índia.

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Contra a moral e os bons costumes: a ditadura e a repressão à comunidade LGBT. Renan Quinalha.
Companhia das Letras • 416 pp • R$ 89,90

Um dos responsáveis pela organização do livro História do movimento LGBT no Brasil (2018), o professor da Unifesp reconstitui as políticas sexuais da ditadura militar, apontando a violência policial contra homossexuais, travestis e prostitutas nas capitais brasileiras e mostrando os desafios encontrados a partir de 1976 pelo então nascente movimento homossexual brasileiro para se articular em uma conjuntura ambígua de liberalização política controlada (a “abertura”), ainda marcada pela persistência das estruturas autoritárias. O livro descreve a perseguição ao jornal Lampião da Esquina, produzido por homossexuais e que circulou de 1978 a 1981, e analisa a atuação do Serviço de Censura de Diversões Públicas (defensor “da moral e dos bons costumes”). Por fim, ele mostra as coincidências entre a ditadura e o atual cenário político. 

Leia também: Lançada em 1986, obra que trata da homossexualidade ao longo da história do Brasil ganha edição ampliada.

Ouça também: Episódio do podcast Revoar reflete sobre por que negros e LGBTQI+ estão sempre nas estatísticas dos que mais morrem no Brasil.

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Belo mundo, onde você está. Sally Rooney.
Trad. Débora Landsberg • Companhia das Letras • 532 pp • R$ 54,90

O terceiro romance da autora de Conversa entre amigos (2017) e Pessoas normais (2019), que deram origem a séries da BBC, está centrado na amizade entre a jovem romancista Alice e a editora Eileen. A primeira entabulou um relacionamento com o empregado de um armazém suburbano que encontrou no Tinder, enquanto a segunda flerta com um amigo de infância. Considerada uma das principais escritoras da geração millennial, a feminista irlandesa retrata as perspectivas, as angústias e os dramas dos jovens contemporâneos. 

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Janeiro. Sara Gallardo.
Trad. Ellen Maria Vasconcellos • Moinhos • 96 pp • R$ 48

Lançado em 1958, o livro marcou a estreia da autora portenha, que logo se tornaria uma das principais escritoras do país (seu romance Eisejuaz, de 1971, é uma obra experimental cuja escrita é frequentemente comparada à de Juan Rulfo). A protagonista de Janeiro é Nefer, uma jovem de dezesseis anos que vive em uma comunidade rural do norte da Argentina. Enamorada de um homem, acabou sendo violentada por outro, engravidou e se pergunta o que os outros vão pensar dela, já que a colheita se aproxima e está cada vez mais difícil ocultar a barriga.

Sara Gallardo em 1977 [Reprodução]

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Homens justos: do patriarcado às novas masculinidades. Ivan Jablonka.
Trad. Julia da Rosa Simões • Todavia • 432 pp • R$ 89,90

Ao fazer um ensaio sobre a história da dominação patriarcal, o historiador francês pretende reconciliar a masculinidade com os direitos das mulheres. Ele sustenta que o homem branco heterossexual não representa toda a humanidade e por isso precisa ceder espaço aos outros: ele constitui apenas um ponto de vista entre muitos. O autor mostra que, ao longo da história, poucos homens lutaram pela igualdade — mesmo porque isso significa lutar contra os próprios privilégios — e traça a genealogia dessa masculinidade dissidente, normalmente encontrada nos homens estigmatizados em cada época — como judeus, negros, homossexuais, intelectuais e os primeiros cristãos.

Leia também: Como o patriarcado afeta a experiência feminina no espaço urbano.

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Má feminista. Roxane Gay.
Trad. Raquel de Souza • Globo Livros • 320 pp • R$ 49,90

Por meio de ensaios, a escritora norte-americana critica as diversas formas como o feminismo é distorcido e reduzido a uma caricatura por aqueles que temem o empoderamento das mulheres. Os clichês afastaram e ainda afastam muitas mulheres do movimento. “Sinto raiva quando as mulheres repudiam o feminismo e recusam o rótulo de feminista, porém, em contrapartida, alegam apoiar todos os avanços oriundos do feminismo, porque percebo aí uma desconexão que não precisa existir”, escreve Gay. Ela observa que o feminismo tem falhas, mas tem ajudado as mulheres a descobrir que suas vozes também precisam ser ouvidas. O livro discute questões de raça, gênero e identidade na esfera cotidiana e na cultura moderna (música, cinema, televisão, literatura).

Roxane Gay em Montreal, 2015 [Reprodução]

Trecho do livro: “Sei que o feminismo é complexo, está evoluindo e é imperfeito. Sei que o feminismo não irá nem será capaz de consertar tudo. Acredito na igualdade de oportunidades entre mulheres e homens. Acredito que as mulheres devam usufruir da liberdade reprodutiva, além do acesso aos serviços de saúde de que necessitam a preços acessíveis e sem entraves. Acredito que as mulheres devam ser remuneradas do mesmo modo que os homens quando exercem as mesmas funções. O feminismo é uma escolha. E, se uma mulher não quiser ser feminista, esse é um direito dela, mas ainda assim é minha responsabilidade lutar pelos direitos dessa outra mulher”.

Leia também: Françoise Vergès e Heloisa Buarque de Hollanda exploram as perspectivas decoloniais do feminismo.

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Coração subterrâneo: poemas escolhidos. Olga Savary.
Posf. Laura Erber • Todavia • 128 pp • R$ 54,90/39,90 

A antologia da escritora paraense, que morreu em maio do ano passado, vítima da Covid-19, reúne cem poemas de toda a sua carreira. Savary estreou com Espelho provisório (1970), ganhador do prêmio Jabuti de autor revelação. Em 1977 lançou Sumidouro, que lhe rendeu o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte, e em 1982 publicou Magma, coletânea de versos eróticos.

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Quem escreveu esse texto

Marília Kodic

Jornalista e tradutora, é co-autora de Moda ilustrada (Luste).

Mauricio Puls

É autor de Arquitetura e filosofia (Annablume) e O significado da pintura abstrata (Perspectiva), e editor-assistente da Quatro Cinco Um.