Economia,

As lições de Nath Finanças

Ao lançar seu primeiro livro, a administradora critica a falta de didatismo em obras de finanças pessoais e conta como "Crepúsculo" a incentivou a ler

01mar2021

Livro, trabalho de conclusão de curso, empresa crescendo, pesquisas sobre auxílio emergencial, crises de ansiedade. É assim que Nathália Rodrigues — mais conhecida como Nath Finanças, por falar de finanças pessoais de modo divertido e didático — resume o ano de 2020. Já o lema de 2021, para ela, é “como se reerguer”, seguindo os questionamentos do seu público, que, no ano passado, sentiu dificuldade para entender como ter acesso ao auxílio emergencial do governo e, agora, procura se reestruturar economicamente. Dona do canal do YouTube Nath Finanças, que completou dois anos em janeiro, a jovem de 22 anos de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, construiu uma invejável base de seguidores na internet: além dos mais de 220 mil inscritos no canal, ela possui mais de 460 mil seguidores no Twitter e mais de 320 mil no Instagram. Apresentadora do podcast Boletos pagos, produção original do Spotify, Nath agora se embrenha pelo mercado editorial.

Orçamento sem falhas: saia do vermelho e aprenda a poupar com pouco dinheiro, lançado pela Intrínseca, é um livro que segue a receita de sucesso dos vídeos de Nath. Com linguagem simples e objetiva, a obra traz o básico para o leitor se organizar financeiramente, explicando o que é inflação e cheque especial (conceitos tidos como de conhecimento comum em outros livros do gênero) e trazendo vários exemplos do dia a dia, além de ilustrações e — claro! — memes. 

Os capítulos do livro foram estruturados a partir dos roteiros dos vídeos postados no YouTube, escritos por ela. “Nunca imaginei a Nathália escritora, mas, quando você faz um roteiro, está criando um texto. Foi muito legal olhar e perceber que eu realmente sei escrever. Porque bate uma insegurança, sim”, confessa, revelando que gosta mais de escrever threads no Twitter do que fazer vídeos. Para ela, foi importante lançar o livro após se formar na faculdade de administração, o que aconteceu no fim do ano passado. Um diploma lhe traz mais credibilidade na área, uma vez que quer fugir do estereótipo da “YouTuber que lançou um livro”.

“Esse livro é para quem quer começar do começo. É para o leigo que estava com medo de aprender sobre finanças, e por isso tem uma linguagem didática. É frustrante não conseguir entender o conteúdo”, diz Nath em entrevista à Quatro Cinco Um. No começo da obra, ela explica que o foco é o leitor de baixa renda, o trabalhador, o estagiário, o universitário, que eram deixados de lado no universo das finanças. Mas ela observa que recebeu feedback de pessoas de renda mais alta que disseram ter aprendido muito mais com o seu livro do que com outras obras parecidas. 

‘Essa era uma dor que eu sentia: ler livros de finanças sem exemplos reais do dia a dia’

“Essa era uma dor que eu sentia: ler livros de finanças de uma forma que não é didática, sem exemplos reais do dia a dia”, diz Nath, que, durante a graduação, lia os livros e se sentia “burra” por não entender o conteúdo. A exceção, para ela, é Eduardo Amuri, autor de Dinheiro sem medo (Benvirá, 2017) e Finanças para autônomos (Benvirá, 2018). “Ele fala de algo complexo, mas ao mesmo tempo traz a didática. Era isso que eu queria para o meu livro, e estou bem feliz com o resultado”, comenta.

O plano agora é distribuir 2 mil exemplares de Orçamento sem falhas para bibliotecas, institutos e pessoas que gostariam de ter o livro, mas se encontram impossibilitadas de comprá-lo. No horizonte também há um projeto de fazer um livro sobre finanças voltado para crianças.

Incentivo à leitura

Não são só livros de finanças que alimentam os hábitos de leitura de Nath. Obras do filósofo e historiador italiano Domenico Losurdo, do historiador pernambucano Jones Manoel, da socióloga goiana Sabrina Fernandes e do ator carioca e criador da websérie Girls in the House, Raony Phillips, estão entre as suas preferências. “Leio autores com quem me identifico e que acompanho nas redes sociais, inclusive pensadores que são investidores.”

O livro que abriu o mundo da leitura para ela foi Crepúsculo, a saga de vampiros da norte-americana Stephenie Meyer, cujos livros foram lançados no Brasil pela Intrínseca. “Eu era tão fã que juntei dinheiro para comprar só um, Amanhecer, de quinhentas páginas, porque não tinha dinheiro para comprar a coleção toda. Depois ganhei a trilogia completa.”

Na sua visão, esse livro incentiva muito a leitura. “Até comecei a falar palavras bem difíceis na época, porque o Edward [o vampiro protagonista] falava de uma forma bem antiga. E eu adorava. Foi o primeiro livro que eu tive iniciativa de ler, sem que uma professora na escola mandasse. Foi porque eu quis, um livro de quinhentas páginas! Eu ficava: ‘Cara, me superei!’” Outro livro que ela leu e releu, apesar de ter sido indicado pela professora, foi o romance Extraordinário, de R. J. Palacio (Intrínseca, 2013).

Nath discorda totalmente da fala do ministro Paulo Guedes de que “livro é coisa de elite” para justificar a tributação sobre o item proposta pelo Ministério da Economia no ano passado. “O livro não é de elite. Faz a gente questionar muitas coisas. Esses governos se preocupam quando lemos livros, quando estamos questionando. Imagina se todo mundo tivesse um livro explicando os termos bancários para você não pagar tarifa para ter conta. Multiplique isso por milhões. Será que é interessante? Normalmente, não é”, observa. 

Na sua visão, o governo é “elitista e classicista de achar que só a elite lê. Pelo contrário. Às vezes, a pessoa não lê livros porque não tem dinheiro para comprar. Anos atrás, não tinha como uma pessoa de baixa renda comprar. Hoje, as editoras estão colocando no mercado livros mais em conta, em formato PDF, e eles estão se tornando acessíveis aos poucos. Encarar como se fosse de elite é totalmente errôneo. Achar isso é só uma forma de tirar o conhecimento da gente, porque é com o livro, o conhecimento, que se transformam vidas e se muda o sistema”, rebate.

Quem escreveu esse texto

Paula Carvalho

Jornalista e historiadora, é autora e organizadora de ireito à vagabundagem: as viagens de Isabelle Eberhardt (Fósforo).