Divulgação Científica,

Tudo pode mudar

David Wallace-Wells, autor de livro sobre os impactos do aquecimento global, discute o futuro que assombra o planeta

02jul2019

Em A terra inabitável: uma história do futuro (Companhia das Letras), o jornalista David Wallace-Wells descreve as mudanças causadas pelo aquecimento global não só no planeta, mas também na esfera mais íntima da vida humana. Trata-se do livro que os assinantes do Clube 451 recebem no mês de julho junto com a revista Quatro Cinco Um (saiba mais sobre o clube aqui).

Editor-adjunto da New York Magazine, Wallace-Wells estará na Festa Literária de Paraty (Flip), onde dividirá com a repórter Cristina Serra no sábado, 13 de julho, às 20h30, a mesa Cocorobó — nome do açude que inundou a segunda Canudos em 1969, que foi construída no mesmo local da cidade original em 1910 pelos sobreviventes da guerra —, em que falarão sobre jornalismo ambiental, os impactos climáticos da intervenção humana no mundo e o futuro que nos assombra. Mas antes Wallace-Wells conversou com a Quatro Cinco Um sobre os livros que o inspiraram ao longo da sua trajetória.

Um livro que despertou seu interesse pelo jornalismo? É uma escolha estranha, mas o livro que, de fato, me abriu os horizontes e mostrou o quanto o jornalismo poderia ser algo reflexivo, bem informado e incisivo foi A jornalista e o assassino, de Janet Malcolm (Companhia de Bolso) — pelo seu trabalho com a escrita de não ficção bem como o assunto propriamente dito.

Um livro que o levou a pensar sobre as mudanças climáticas? Não foi tanto pelos livros, mas por artigos científicos, que cheguei à questão. Teve um livro em especial, no entanto, que serviu de guia para o meu pensamento, Tudo pode mudar —capitalismo versus clima, de Naomi Klein (Editorial Presença) — porque, de fato, tudo pode.

Um livro que o mantém são diante das perspectivas de uma terra inabitável? Na verdade, eu não acredito que o planeta vá realmente se tornar um lugar inabitável — não por um bom tempo, pelo menos. Acredito que provavelmente vamos ter que lidar com uma boa dose de sofrimento por consequência das mudanças climática. Recentemente, tenho mantido meu bom humor com a ajuda de livros que leio para a minha filha — que completou um ano, e tem a vida inteira pela frente.

 Um livro de ficção que o influenciou? É uma peça, na verdade, mas a obra de escrita imaginativa que me vem à mente com maior frequência é The designated mourner [O enlutado escolhido], de Wallace Shawn. É uma peça estranha, composta inteiramente por monólogos, com três personagens. Trata de uma cultura em colapso.

Um livro que você gostaria de um dia escrever? Tenho cismado com uma história sobre meus avós, tanto do lado do pai quanto da minha mãe. De um lado, um casal de refugiados do Holocausto, que vieram aos Estados Unidos e se tornaram espiões para a Alemanha Oriental. O comprometimento deles com a causa socialista era tamanho que eles trabalharam em prol de uma nação que havia (em um certo sentido) dizimado suas famílias inteiras. Do outro lado, meus avós eram parte da velha-guarda norte-americana — vieram aos Estados Unidos no navio Mayflower, em 1620, e ascenderam até o ápice da sociedade corporativa. Em outras palavras, a esquerda e a direita do país, resumidas em uma só família.

Teve algum livro que fez você pensar sobre o Brasil? Já passei muito tempo pensando sobre o Brasil! Morei no Rio de Janeiro em 2004 e 2005 e, nesses últimos cinco anos, tenho acompanhado com aflição a queda brusca daquilo que parecia ser um período de crescimento e ânimo para o que parece ser um estado de falência, pelo menos para quem vê de fora. É claro que algo do otimismo do começo dos anos 2000 era ilusório, e a corrupção e violência ainda estavam lá, sub-reptícias. Mas aquela época parecia abrir espaço para que esse país lindo e inspirador pudesse finalmente cumprir a promessa de oferecer uma vida satisfatória e próspera para todos seus cidadãos. À medida que me envolvi com as preocupações climáticas, minha aflição foi crescendo — mais ainda quando vi Jair Bolsonaro entrar em cena…

Este texto foi realizado com o apoio do Instituto Serrapilheira.

Quem escreveu esse texto

Sofia Nestrovski

É mestre em Teoria Literária pela USP.