O livro Por que choramos?, de Fran Pintadera e Ana Sender, publicado pela editora WMF Martins Fontes, acaba de ser lançado no Brasil e não poderia ter vindo em melhor hora. Falar com delicadeza e poesia sobre os motivos que nos fazem chorar é tudo de que precisamos depois de dois anos de pandemia. Pais que vivenciaram intensamente a rotina presos em casa com suas crianças, não importando a idade, ficaram sem respostas diante das perguntas feitas pelos filhos.
Por que choramos?, de Fran Pintadera e Ana Sender
Na história escrita pelo autor espanhol, nascido nas Ilhas Canárias, Mário pergunta para sua mãe por que a gente chora. Após uma pausa, a mãe rememora vários motivos que nos fazem chorar: tristeza, raiva, falta de compreensão, o vazio que sentimos dentro da gente, quando o choro simplesmente transborda… os motivos são vários e muitos deles conhecidos por todos nós. Nos últimos dois anos, essas razões foram apresentadas como uma avalanche às crianças. A pandemia antecipou de forma condensada sentimentos complexos que dificultaram a elaboração das crianças, que encheram seus pais de perguntas.
Compreender camadas profundas dos nossos próprios sentimentos nem sempre é uma tarefa fácil. Mas Pintadera e Sender exploram os recursos narrativos visuais e textuais em sua máxima potência, nos propiciando desvendar as emoções de modo delicado e poético.
Metáforas
Através das metáforas, percorremos as diferentes camadas de compreensão, tornando essa leitura repleta de delicadeza. Enquanto o texto nos conta que um dos motivos de chorarmos é por raiva, a imagem retrata uma nuvem carregada de raios, pronta para disparar seus trovões. E é nesse jogo entre o texto e as metáforas visuais que vamos percorrendo o livro. Nenhum elemento está ali por acaso. O que nem sempre precisa ser dito em palavras é explicitado por meio de uma cor, pela espessura de um traço, pela técnica usada na ilustração, pela disposição dos elementos nas páginas ou até mesmo pela ausência de tudo isso.
Em Por que choramos?, cada dupla é uma surpresa. O leitor encontra uma personagem coberta por uma nuvem de lágrimas para representar como a vontade de chorar simplesmente vem. Em outra dupla, o choro se transforma em galhos coloridos, fortes e frutíferos, que impedem a personagem de virar pedra. Mas talvez uma das cenas mais marcantes seja a que traduz como a lágrima é um signo universal. Em uma paisagem devastada, há o encontro de um animal com uma menina, ambos segurando uma folha com o desenho de uma lágrima. Assim o leitor reflete que não importa como, quando e com quem estamos, falamos a mesma língua quando choramos.
A beleza deste livro ilustrado está aí nesse diálogo entre texto e imagem. Está no modo como essa união das linguagens reverbera na gente, dando voz a sentimentos difíceis de ser ditos. O livro ajuda a nos aproximarmos de nós mesmos, ampliando nossa percepção do outro e do que está ao nosso redor. O choro então é sempre bem-vindo, mesmo quando não compreendemos por que ele está acontecendo. “As lágrimas aprendem a deslizar por dobradiças”, como nos lembram os autores do livro.
Uma das cenas mais marcantes é a que traduz como a lágrima é um signo universal
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Em tempos sombrios, como o que estamos vivendo nos últimos anos e por tudo que ainda está por vir, chorar é sinal de saúde, lucidez, coragem e resiliência, principalmente em um país como o nosso. E tudo bem, pois essa é uma das coisas que aprendemos quando fechamos o livro.
Este texto foi realizado com o apoio do Itaú Social
