Literatura,

Listão do autoritarismo

Pesquisadores do Laut selecionam lançamentos sobre liberdade, autoritarismo, democracia e política

01mar2020

Heinrich Geiselberger (org.). A grande regressão: um debate internacional sobre os novos populismos — e como enfrentá-los. Estação Liberdade. 352 pp. R$ 69,90

Dezesseis textos (já traduzidos para quinze idiomas) que exploram os riscos da globalização e do neoliberalismo a partir de diversas perspectivas teóricas.

Appadurai, por exemplo, afirma uma coincidência parcial e acidental entre os interesses de líderes populistas autoritários e a impaciência dos eleitores com os tempos da democracia, em face da deterioração das condições materiais de vida.

Fraser dialoga com Appadurai ao enfatizar a desarticulação da esquerda nos eua. Formula a encruzilhada do eleitor entre o neoliberalismo progressista e o populismo autoritário, ambos incapazes de enfrentar as questões distributivas.

Quanto ao Brasil, Renato Janine Ribeiro aponta a conexão entre o aumento da miséria, o descaso ambiental e a ausência de consciência histórica. Finaliza, recorrendo a Borges, com mensagem que permeia os demais trabalhos: a importância do diálogo e do respeito ao antagonista político.

Leonardo Avritzer. O pêndulo da democracia. Todavia. 208 pp. R$ 69,90

Em meio à recessão democrática, Avritzer defende que a democracia no Brasil é pendular. O livro ilumina os flancos contrademocráticos da institucionalidade brasileira, que podem ser e são mobilizados pelas elites em momentos de crise. Destacam-se o impeachment, que no Brasil foge à tradição de raridade destinada a situações graves; a Justiça Eleitoral, que altera resultados eleitorais e avança sobre a soberania; e a escassez de controles sobre a interferência das Forças Armadas na área de segurança pública.

O convívio entre o modelo patrimonialista e o modelo social de Estado, institucionalizados na Carta de 1988, tensiona o cenário. E também as novas emergências de intolerância, associadas a tradições de violência mas também a novidades culturais, sobretudo as religiosas e tecnológicas. A conclusão aponta os caminhos para a reversão do pêndulo: convida a sociedade civil à insistência nos valores e direitos democráticos e clama pelo urgente retorno da legalidade entre os poderes da República.

Diogo Sardinha. A tirania dos poderes coniventes: o Brasil na conjuntura. 128 pp. R$ 38

Escrito pelo filósofo e antropólogo português, o livro parte da pergunta se o Brasil já foi uma democracia e busca explicar as relações de poder estruturais do “Pacto de Brasília”. Por vezes o tom é de uma narrativa pessoal e etnográfica, cara ao antropólogo em constante trânsito pelo país. A argumentação é respaldada em referências que vão do cinema italiano ao jornalismo brasileiro. Contracorrente.

Jessé Souza. A elite do atraso: da escravidão a Bolsonaro. 272 pp. R$ 44,90

Edição atualizada do livro publicado em 2017, traz interpretação do sociólogo de que a herança patrimonialista e escravista brasileira se perpetua em eventos como a Operação Lava Jato, sob o pacto da elite com a classe média e a participação da imprensa. O ensaio, com retórica aguda e tom pessoal, agora traz um posfácio sobre a ascensão de Jair Bolsonaro ao poder, com crítica à posição da esquerda nas eleições. Sextante.

Thaís Oyama. Tormenta: o governo Bolsonaro. Crises, intrigas e segredos. 272 pp. R$ 54,90

A experiente repórter conta o primeiro ano da Presidência Bolsonaro. Em ritmo jornalístico, introduz o passado militar indisciplinado e a carreira parlamentar indecorosa do protagonista para então focar personagens e episódios de seu début presidencial. Com informações apuradas técnica e discretamente, é a mais completa narrativa disponível sobre o bolsonarismo no poder. Companhia das Letras.

Lilia Moritz Schwarcz. Sobre o autoritarismo brasileiro. 288 pp. R$ 49,90

Foca o que ficou para lembrar o que os mitos fazem esquecer. A historiadora mostra como persistem o racismo escravista, o mandonismo oligárquico, o patrimonialismo, as desigualdades e a discriminação. Aponta para ideologias e comportamentos registrados não só em fotos e documentos, mas no vocabulário, nas práticas públicas, nas relações privadas e até na forma como contamos a história. Companhia das Letras.

Novo centro de pesquisa fundado por intelectuais que arejam o debate jurídico passa a ter espaço mensal na revista dos livros

Lira Neto. Castello: A marcha para a ditadura. ompanhia das Letras. 464 pp. R$ 79,90

Republicação do livro lançado em 2004, Castello foi das primeiras obras na carreira de Lira Neto como biógrafo. Abrange desde a infância do marechal até sua enigmática morte num acidente em 1967, quando havia se tornado um crítico da “linha dura” de Costa e Silva. Explora dilemas da vida pública do homem que foi decisivo na consolidação da ditadura que ele dizia não querer.

Marina Basso Lacerda. O novo conservadorismo brasileiro: de Reagan a Bolsonaro. Zouk. 228 pp. R$ 47

Fruto de tese defendida no Iesp/Uerj, o livro busca compreender o neoconservadorismo brasileiro (que culminou com a eleição de Bolsonaro) por referência ao fenômeno análogo nos eua, que levou Reagan à Presidência. Alia análise conceitual das correntes internas do movimento a debates sobre a recente conjuntura brasileira e estudos empíricos sobre as votações parlamentares.