Fichamento,

Maria Flor

A atriz e produtora estreia na literatura com um romance sobre uma jovem mulher que quer descobrir seu lugar no mundo (e o amor)

23abr2021 | Edição #45

Já não me sinto só (Planeta), o primeiro livro de Maria Flor, conta a história de uma atriz e seu processo de autodescoberta após uma separação amorosa.

Seu livro é uma ficção, mas, já na introdução, você escreve “essa é a minha história”, e a narradora é uma atriz como você… Essa confusão entre personagem e autora foi proposital?

Usei essa proximidade, até confusão, para facilitar o processo de escrita e criar uma conexão rápida com o leitor. Tudo bem isso ser misturado. No mundo em que a gente está vivendo, essa confusão faz muito sentido; a rede social é isso. As pessoas podem achar que é autobiográfico, não me importo, mas também faço questão de dizer que é ficcional, um romance. 

Quais as diferenças entre a exposição que você está acostumada a receber como atriz e a que espera receber agora, como escritora?

Você se expõe mais no livro. No trabalho de atriz sempre há alguma forma de anteparo — a câmera, a maquiagem, a direção. No livro, mesmo não sendo eu, mas um personagem de ficção, mostro toda a minha subjetividade. Fico muito exposta, mas quis fazer isso. Pode ter algo de autobiográfico no sentido de ser uma história de uma jovem mulher que quer entender qual é o seu lugar no mundo e para onde ela vai. E isso pode fazer sentido para outras mulheres. Espero que faça.

O romance tem muitos diálogos, cenas durante a filmagem de um longa e até a sinopse do filme no qual a narradora atua. Ao escrever, você pensou em uma possível adaptação do livro para o cinema?

Sim, várias vezes imaginei como um filme, via as imagens. A sinopse não iria entrar, mas, em uma das reescritas, percebi que era importante para contar a história. Na primeira versão escrevi tudo no presente, mas não funcionou e mudei. O livro é uma reconstrução da memória da narradora em três situações diferentes: no momento da sua separação, quando viaja para filmar e as suas lembranças do filme em que atuou. Eu adoraria que o romance virasse um filme, é um sonho.  

Quais foram os seus maiores desafios em sua estreia como escritora?

Levei três anos para escrever, de 2017 a 2020. Durante esse tempo, continuava atuando em novelas, fazendo outros trabalhos. Passava grandes períodos sem escrever, voltava ao texto, mudava um monte de coisa. O impulso para terminar foi a pandemia. Eu já tinha escrito quase metade, mas tive um bloqueio, não conseguia mais escrever. Chegou a pandemia e pensei “cara, é agora”, mas quase desisti. Joguei fora o primeiro final que tinha imaginado e voltei a escrever e reescrever. Sinto um certo constrangimento por estar lançando um livro. Sei que é bobagem. É a história que consegui contar. Uma história simplista, que às vezes eu achava boba. Será? Talvez seja boa. Quando a gente coloca algo no mundo, não tem mais controle, nunca sabe como vai chegar às pessoas. Provavelmente não serei amada pelo livro, mas o fato de alguém ler o que escrevi já é tão legal… Livros impressos são, para mim, objetos perfeitos e, apesar de eu ter certo pudor de lançar um, estou muito orgulhosa de ter escrito esse objeto-livro que sempre vai estar no mundo concreto.    

Quais são suas influências literárias?

Clarice Lispector. É cafona dizer isso? Leio e releio e não consigo entender como ela tinha toda aquela vida dentro dela. É uma grande influência para mim, não como estilo literário, mas como mulher. Também adoro Saramago; é outro que tem o domínio da palavra, uma parada muito louca. Pensando em autoficção, Karl Ove [Knausgård] é uma referência, por causa de sua série Minha luta. Mas nenhum desses escritores me influenciou diretamente no meu livro.

Quem escreveu esse texto

Iara Biderman

Jornalista, , editora da Quatro Cinco Um, está lançando Tantra e a arte de cortar cebolas (34)

Matéria publicada na edição impressa #45 em abril de 2021.